[«Ou bem que a história não tem sentido e futuro, ou o seu sentido e futuro são os do homem e seu progresso. O homem real, o ser de carne e de sangue, e não um mito mais ou menos idealista. O homem en faisant, não feito de uma vez por todas, tal qual o vêem todos os fixismos de antanho. Um simples verme que rói o fruto do tempo, dominado, antes de tudo, pelas suas necessidades materiais e pelas leis de cada sistema de produção. O direito é o produto deste sistema e, ao mesmo tempo, o sei indispensável alicerce».
Orlando de Carvalho, Os Direitos do Homem no Direito Civil Português, Vértice, Coimbra, 1973, pág. 10 ].
Esta palestra proferida em França em Janeiro de 1972, corporizada em livro de apenas 45 págs, cada uma delas a carecer e apelar para a leitura atenta e ponderação, pela análise histórica de evolução de mitos que, com recurso a Hamlet, pode sintetizar em «words, words, words», que não afastam a lei do mais forte, mas encara o sentimento do mais fraco, que compara, avalia e critica. O direito como ordem estabelecida e o direito como princípio de contestação e de luta.
Deixemos as referências históricas da sociedade do esclavagismo ou da hierarquia feudalista, saltando para a actualidade, munidos agora de bússola que encara o homem, a sua vida e dignidade, como o centro de actividade jurígena, olhando os afloramentos históricos alcançados e dando ao Direito in ferendo, em cada momento histórico-concreto o contributo de uma permanente dialéctica entre o que é e o que pode ou deve vir a ser.
Ainda que alguns recuos possam ocorrer, pois o direito, por si só, não pode concretamente sobreviver no âmbito de crises económicas mundiais, que apelam à reconstrução do modelo, - e aqui a Ideia de Direito justo tem de reocupar o seu espaço, sob pena de viloências de rua, como as recentes na França e na Grécia - o que, aliás, tem sido uma virtude apontada por alguns ao capitalismo: a sua capacidade de auto-regeneração, apesar de vidas que se perdem no deserto de ideia e de vazio, «misto de tédio, dor e raiva» a que alude António Arnault, Rio de Sombras, no contexto da juventude perante a Guerra Colonial.
Cumpre, em louvor do Código Civil Português de 1966 – com algumas adaptações urgentes à Constituição de Abril – que já nele se contemplava, logo a seguir às questões de personalidade e capacidade jurídica, uma Secção II - Direitos de personalidade (Artigo 70.º a 81.º) dedicada aos direitos de personalidade, como se enumera:
Artigo 70.º CC - Tutela geral da personalidade
Artigo 71.º CC - Ofensa a pessoas já falecidas
Artigo 72.º CC - Direito ao nome
Artigo 73.º CC – Legitimidade (nas acções relativas à defesa do nome)
Artigo 74.º CC – Pseudónimo (quando tenha notoriedade, goza da protecção conferida ao próprio nome)
Artigo 75.º CC - Cartas-missivas confidenciais
Artigo 76.º CC - Publicação de cartas confidenciais
Artigo 77.º CC - Memórias familiares e outros escritos confidenciais
Artigo 78.º CC - Cartas-missivas não confidenciais
Artigo 79.º CC - Direito à imagem
Artigo 80.º CC - Direito à reserva sobre a intimidade da vida privada
Artigo 81.º CC - Limitação voluntária dos direitos de personalidade
Segundo o ensino de Carlos da Mota Pinto, «incidem … sobre a vida da pessoa, a sua saúde física, a sua integridade física, a sua honra, a sua liberdade física e psicológica, o seu nome, a sua imagem, a reserva sobre a intimidade da sua vida privada.
É este um círculo de direitos necessários; um conteúdo mínimo e imprescindível da esfera jurídica de cada pessoa - o carácter categórico desta asserção só podendo sofrer alguma atenuação no respeitante ao direito ao nome, dado o seu carácter não «inato».
Visam proteger os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral.
Se o tema não for desenvolvido neste espaço em busca de abordagem de novos temas, designadamente o supra referido artigo 70.º, remetemos os leitores mais interessados para a minuciosa e excelente obra de Rabindranath V.A. Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, Coimbra Editora, 1995.
Nota: Este artigo destinava-se ao blogue ocidadao peranteodireito, pelo que nele será inserido.